
Parte VI - O renascimento
Uma nova crise ocorrida em 1846, nas vésperas e no contexto de novas turbulências políticas, com a guerra civil da Patuleia, e o levantamento popular da Maria da Fonte, acabou por ditar o desfecho institucional esperado de reconfiguração das instituições bancárias e financeiras que levaria à fusão do Banco de Lisboa com a Companhia Confiança Nacional e à gestação do Banco de Portugal.
Museu do Dinheiro
Os últimos tempos
O período de guerra civil entre Absolutistas e Liberais, que Portugal viveu entre 1832 e 1834, bem como as sucessivas alterações dos governos, levaram a uma situação de forte instabilidade política e económica no país. O governo de Costa Cabral, entre 1842 e 1846, esforçou-se por investir na modernização do país, através de políticas assentes nas obras públicas, na educação e na saúde. No entanto, o pesado endividamento causado por estas políticas, alicerçadas na contração de volumosos empréstimos à banca, levou à complicação da já existente crise económica. Este estado de incerteza política e social gerou o pânico nos portadores de notas do Banco de Lisboa, e gerou uma afluência à troca de notas por prata. Com um rácio de liquidez já abaixo do que as normas prudenciais aconselhavam, o Banco de Lisboa viu-se obrigado, ao fim de alguns dias desta corrida à troca de notas, a suspender os pagamentos das mesmas. A 22 de maio de 1846 a Direção solicitou à rainha, uma moratória para os pagamentos.
O Curso Forçado
O curso forçado, obrigação legal da aceitação de determinada divisa, foi algumas vezes apresentado pelo Governo como solução para a corrida à moeda metálica, que esvaziava os cofres do Banco de Lisboa e colocava em causa a confiança sobre a nota emitida.
Em 1837 a Direção do Banco manifesta a sua oposição a tal recurso, justificando que a confiança deveria vir da saúde financeira das instituições. No entanto, 9 anos mais tarde, em 1846, a situação de falta de confiança do público obrigaria a que fosse o próprio Banco de Lisboa a propor a imposição legal da aceitação das suas notas.
Arquivo Histórico do Banco de Portugal


"Curso Forçado" - Caricatura de Cecília sobre o Banco de Lisboa no "Suplemento Burlesco" na revista "O Patriota"
Em Maio de 1846 foi pela primeira vez decretado o curso forçado das notas do Banco de Lisboa, uma medida impopular acolhida com desagrado pelo público.
Arquivo Histórico do Banco de Portugal
A Companhia Confiança Nacional
A partir de 1838 foram criadas companhias destinadas a realizar operações com o Estado, financiando-o em troca de benefícios cedidos por este. Estas Companhias, de forma geral, sofreram também com a instabilidade política e económica que tornou mais incerto os seus futuros. Uma dessas companhias, a Companhia Confiança Nacional, criada em 1844 na sequência da arrematação do Contrato do Tabaco, Sabão e Pólvora, teve o seu destino ligado ao do Banco de Lisboa. Os sucessivos empréstimos feitos ao Governo e a falta de pagamento por parte deste, leva a Companhia a uma situação difícil, que conduzirá à assinatura do Decreto de 19 de Novembro de 1846, pelo qual o ativo e o passivo da Companhia são integrados no ativo e no passivo do Banco de Lisboa.
Título de ação da Companhia Confiança Nacional
Mercador e homem de negócios inglês, Abraham Wheelhouse adquiriu os primeiros 30 títulos de ação da Companhia Confiança Nacional, equivalentes a 30 milhões de réis. Como relevam os vários carimbos neste título, a subscrição do capital não chegou aos 50% e a Companhia só conseguiu pagar os dividendos relativos a 1845. Com efeito, a instituição estava insolvente e entrou em dificuldades nos finais de maio de 1846. Porém, o capital investido não foi perdido: em 28 de junho de 1847, Wheelhouse recebeu ações do Banco de Portugal no valor nominal correspondente
Museu do Dinheiro
A génese do Banco de Portugal
A solução para resolver a crise monetária e económica do país foi alvo de prolongado debate pelo Governo a partir do Verão de 1846. Em novembro o Governo enviou ao Banco de Lisboa e à Companhia Confiança Nacional um projeto de reabilitação do primeiro através da sua união com a segunda. Este documento seria a base para a Lei de 19 de novembro de 1846 que constitui o Banco de Portugal.

A tapeçaria que Guilherme Camarinha criou em 1971 para a Sala da Assembleia do Banco de Portugal espelha a continuidade do Banco de Lisboa no Banco de Portugal. Do lado esquerdo, D. João VI entrega ao Barão de Porto Covo, em 1821, a Carta de Lei que reabilita o Banco de Lisboa. Do lado direito, o Visconde de Oliveira recebe de D.ª Maria II o Decreto de 19 de novembro de 1846.
Livro da Porta
O funcionamento do Banco de Lisboa teve continuidade no Banco de Portugal, praticamente sem interrupção. Livros de registo como o Livro da Porta, onde se registavam os requerimentos feitos ao Banco e o respectivo despacho, começam por ter os registos do Banco de Lisboa, para passarem a ter os do Banco de Portugal a partir da fundação deste.
Arquivo Histórico do Banco de Portugal

Livro do ágio das notas do Banco de Lisboa
A suspensão foi prorrogada por duas vezes, até que em novembro as notas se tornaram, de facto, inconvertíveis. Apesar da crise de confiança, o Banco de Portugal continuou as emissões em nome do seu antecessor, mas as medidas do governo foram insuficientes para refrear o ágio, que em abril de 1848 chegou a quase 60%. A amortização de todas as notas do Banco de Lisboa só seria concluída após 1859.
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A conjuntura
A presença de D. João VI e sua corte no Rio de Janeiro, decorrente das invasões francesas, bem como a ingerência britânica, favoreceram um ambiente político e económico, que promovia o descontentamento nacional. Os pronunciamentos militares de 1820, em agosto no Porto e em setembro em Lisboa, tinham como exigências o regresso do rei a Lisboa, e a instauração de um governo provisório que preparasse a convocatória de uma assembleia parlamentar cuja principal missão seria a elaboração de uma Constituição.